O preço da virtude
– (…) O teu misterioso jovem amigo, cujo nome nunca me revelaste, mas cujo retrato me fascina realmente, nunca pensa. Disso tenho eu a certeza. É uma bela e desmiolada criatura que devia permanecer connosco durante todo o inverno quando não temos flores para contemplar, e durante todo o verão quando precisamos de alguma coisa que nos arrefeça a inteligência. Não te lisonjeies, Basil, não és nada parecido com ele.
– Tu não me compreendes, Harry – respondeu o artista. – É evidente que não me pareço com ele. Tenho perfeita consciência disso. Na verdade, não gostaria nada de me parecer com ele. Encolhes os ombros? Estou-te a dizer a verdade. Há uma fatalidade em toda a excelência física e intelectual, o tipo de fatalidade que tem perseguido ao longo da História os passos trôpegos dos reis. É melhor não sermos diferentes dos que nos rodeiam. Os feios e estúpidos são os que mais aproveitam do mundo. Podem sentar-se a olhar e bocejar à vontade. Se não têm qualquer noção do que seja a vitória, é-lhes pelo menos poupado o conhecimento da derrota. Vivem como todos nós devíamos viver, imperturbados, indiferentes e sem inquietações. Nunca causam a desgraça dos outros, nem sequer a recebem das mãos de outrem. O teu título e a tua fortuna, Harry; o meu cérebro, tal como é… a minha arte, o que quer que valha, a beleza do Dorian Gray… Havemos todos de sofrer por aquilo que nos concederam os deuses, de sofrer terrivelmente.
WILDE, Oscar. O Retrato de Dorian Gray, tradução de Margarida Vale de Gato, Lisboa, Relógio D’Água, 1998; pp. 19 – 20.
– Tu não me compreendes, Harry – respondeu o artista. – É evidente que não me pareço com ele. Tenho perfeita consciência disso. Na verdade, não gostaria nada de me parecer com ele. Encolhes os ombros? Estou-te a dizer a verdade. Há uma fatalidade em toda a excelência física e intelectual, o tipo de fatalidade que tem perseguido ao longo da História os passos trôpegos dos reis. É melhor não sermos diferentes dos que nos rodeiam. Os feios e estúpidos são os que mais aproveitam do mundo. Podem sentar-se a olhar e bocejar à vontade. Se não têm qualquer noção do que seja a vitória, é-lhes pelo menos poupado o conhecimento da derrota. Vivem como todos nós devíamos viver, imperturbados, indiferentes e sem inquietações. Nunca causam a desgraça dos outros, nem sequer a recebem das mãos de outrem. O teu título e a tua fortuna, Harry; o meu cérebro, tal como é… a minha arte, o que quer que valha, a beleza do Dorian Gray… Havemos todos de sofrer por aquilo que nos concederam os deuses, de sofrer terrivelmente.
WILDE, Oscar. O Retrato de Dorian Gray, tradução de Margarida Vale de Gato, Lisboa, Relógio D’Água, 1998; pp. 19 – 20.
Adoro esta obra, Hera!
ResponderEliminarDeste-me vontade de voltar ler este clássico!
Obrigada!
Beijocas,
Ariadne