sexta-feira, 22 de fevereiro de 2008

Crepúsculo





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Também este crepúsculo...
Também este crepúsculo nós perdemos.
Ninguém nos viu hoje à tarde de mãos dadas
enquanto a noite azul caía sobre o mundo.
Olhei da minha janela
a festa do poente nas encostas ao longe.
Às vezes como uma moeda
acendia-se um pedaço de sol nas minhas mãos.
Eu recordava-te com a alma apertada
por essa tristeza que tu me conheces.
Onde estavas então?
Entre que gente?
Dizendo que palavras?
Porque vem até mim todo o amor de repente
quando me sinto triste, e te sinto tão longe?
Caiu o livro em que sempre pegamos ao crepúsculo,
e como um cão ferido rodou a minha capa aos pés.
Sempre, sempre te afastas pela tarde
para onde o crepúsculo corre apagando estátuas.
NERUDA, Pablo. Vinte Poemas de Amor e Uma Canção Desesperada, 12.ª edição, tradução de Fernando Assis Pacheco, Lisboa, Publicações Dom Quixote, 2003; pp. 37, 39.

3 comentários:

  1. O crepúsculo é um momento único do dia... Misterioso, mágico, às vezes melancólico... romântico...

    Belo poema do Pablo Neruda!

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  2. Obrigada por este poema, Hera.
    Não conheço muito (ou mesmo nada, para ser sincera) do Pablo Neruda...

    A imagem, porém, cativou-me ainda mais... é que o sol é um girassol...e parece ter olhos e um sorriso aberto... ou é just my imagination?

    Bela escolha!

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  3. Fico contente por apreciarem tanto como eu o Pablo Neruda... É um poeta que me ficou mesmo marcado, a ferro e fogo... E ainda há tanto dele que eu não conheço...

    De facto, a imagem é curiosa: o sol bate de tal maneira na flor, no girassol, que parece que a rasga... Ou a flor já estaria meio dilacerada e é por isso que se vê um pedaço do sol através dela.

    Em breve, hei-de ver se ponho aqui mais umas coisas bonitas do Pablo Neruda.

    Beijinhos a todos.

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