sábado, 28 de abril de 2007

Ainda Fernando Pessoa

Eduardo Lourenço (nascido em 1923), analista da «alma» portuguesa, pensador político, crítico literário, crítico de arte, historiador das ideias, passou a sua vida no exílio, como Jorge de Sena. Pôs o melhor do seu talento ao serviço daquele por quem experimenta um sentimento tão forte que, para o designar, haveria que falar de uma «fé poética». Censura a maior parte dos seus predecessores, e acima de tudo Gaspar Simões e Prado Coelho, por terem querido reduzir Pessoa à medida humana comum, tentando acometer a sua obra pelos métodos habituais da biografia e da crítica, sem compreenderem que estavam a sondar um abismo sem fundo. Mais tarde, com outro livro de título igualmente eloquente, Fernando, Rei da Nossa Baviera, vai impor definitivamente a figura mítica cujo magnífico «túmulo» é formado por todas as suas próprias glosas. «Custa-me imaginar que alguém possa um dia falar melhor de Fernando Pessoa que ele mesmo. Pela simples razão de que foi Pessoa quem descobriu o modo de falar de si tomando-se sempre por um outro.» É impossível explicar Pessoa. «A sua obra inaugura uma literatura-outra e pede, pois, uma crítica-outra. Trata-se, ao mesmo tempo, de uma aventura existencial e ontológica, através da qual se joga não só o sentido do Eu, mas também o sentido do Sentido.»1 Tal como ele, eu sonho com uma glosa do texto que não o desvendasse, antes fosse uma liturgia celebrando a Beleza escondida sob as ideias e dentro das formas.

1 Eduardo Lourenço, Fernando, Rei da Nossa Baviera, Imprensa Nacional-Casa da Moeda, Lisboa, 1986, pp. 9 e 32.

BRÉCHON, Robert, Estranho Estrangeiro. Uma Biografia de Fernando Pessoa, trad. de Maria Abreu e Pedro Tamen, Lisboa, Quetzal Editores, 1996, p. 592.

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