A mulher grávida
Se teve que sair, na rua toda a gente
Olhando para ela, esboça um sorrisinho...
Uma madama opina a outra em tom escarninho:
«-Sair prà rua assim, ai filha, acho indecente!».
Um peralvilho tolo - um bacharel-formado,
De profissão cretino - os dentes arreganha:
«-Olha pra aquela gaja... Ena! como vai prenha!...»
Pra outro néscio diz, julgando-se engraçado.
Por toda a parte o ventre informe é um motivo
De risos e chacota. Estúpida maldade!
Mas esse ventre enorme e duplamente vivo,
Ó súcia, reparai! é a Maternidade!
Sabeis vós por ventura o que isso é, malandro?
Sabeis o que é ser mãe, fedúcia viciosa?
Vós conheceis do amor os lúbricos meandros,
Mas não sabeis o que é ser mãe, mula asquerosa!...
Ser mãe - doce evangelho - é sentir palpitar
Dentro da sua carne, a carne doutro ente;
Fazer da sua alma, a alma desse ente,
Reconhecer que nem só Deus pode criar.
É cumprir a missão pela terra exigida,
É dar-lhe mais alguém que a aperfeiçoe e a amanhe.
É ter quem nos estime e quem nos acompanhe,
É morrer e deixar no mundo a sua vida.
Lá vai por isso a mãe, e sempre imperturbável
Nem ouve os imbecis. Caminha vagarosa,
No rosto uma expressão enternecida, afável:
Pesa-lhe a carga mas transporta-a jubilosa.
E se ouve os risos pensa: «É pra me acostumar
A padecer por ele...» Os risos, os gracejos,
As dor's e tudo mais, ele há-de-lhe pagar,
Ele há-de-lhe pagar e com milhões... de beijos...
Ventre de mãe, fruto maduro,
Ventre de mãe, ventre orgulhoso,
Tu és um cofre precioso,
Tu és o cofre do Futuro!
Olhando para ela, esboça um sorrisinho...
Uma madama opina a outra em tom escarninho:
«-Sair prà rua assim, ai filha, acho indecente!».
Um peralvilho tolo - um bacharel-formado,
De profissão cretino - os dentes arreganha:
«-Olha pra aquela gaja... Ena! como vai prenha!...»
Pra outro néscio diz, julgando-se engraçado.
Por toda a parte o ventre informe é um motivo
De risos e chacota. Estúpida maldade!
Mas esse ventre enorme e duplamente vivo,
Ó súcia, reparai! é a Maternidade!
Sabeis vós por ventura o que isso é, malandro?
Sabeis o que é ser mãe, fedúcia viciosa?
Vós conheceis do amor os lúbricos meandros,
Mas não sabeis o que é ser mãe, mula asquerosa!...
Ser mãe - doce evangelho - é sentir palpitar
Dentro da sua carne, a carne doutro ente;
Fazer da sua alma, a alma desse ente,
Reconhecer que nem só Deus pode criar.
É cumprir a missão pela terra exigida,
É dar-lhe mais alguém que a aperfeiçoe e a amanhe.
É ter quem nos estime e quem nos acompanhe,
É morrer e deixar no mundo a sua vida.
Lá vai por isso a mãe, e sempre imperturbável
Nem ouve os imbecis. Caminha vagarosa,
No rosto uma expressão enternecida, afável:
Pesa-lhe a carga mas transporta-a jubilosa.
E se ouve os risos pensa: «É pra me acostumar
A padecer por ele...» Os risos, os gracejos,
As dor's e tudo mais, ele há-de-lhe pagar,
Ele há-de-lhe pagar e com milhões... de beijos...
Ventre de mãe, fruto maduro,
Ventre de mãe, ventre orgulhoso,
Tu és um cofre precioso,
Tu és o cofre do Futuro!
Lisboa, fevereiro de 1911.
SÁ-CARNEIRO, Mário de - Poemas completos. 2.ª ed. corrigida, Fernando Cabral Martins, ed. Lisboa: Assírio & Alvim, 2001. 228 - 229 pp. ISBN 972-37-0193-6
Nada mais apropriado para esta época em que se celebra a natividade.
ResponderEliminarA evolução que sofreu a visão de uma mulher grávida, primeiro adorada nas estatuetas primitivas, a sociedade civilizada tentou esconder a mulher grávida em casa e só no século XX a mulher assume orgulhosa o seu ventre distendido por uma carga preciosa.
Mas o melhor de tudo é sempre o amor de mãe.
Oscula
Maternidade: GRANDE Missão.
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